terça-feira, 26 de julho de 2011

PRETA

Essa é a história da primeira cachorrinha que meus tutores resgataram das ruas e depois de muita luta conseguiram encontrar um lar para ela. Foi uma experiência nova para eles, mas que os fez, assim como a mim, aprender muito. Vamos lá.

Era um início de noite frio de uma quinta-feira santa de 2007. Depois de esperar que a garoa desse uma trégua, pois ela não parou durante todo aquele dia, meu pai saiu comigo para dar o costumeiro passeio diário (se bem que já se podia chamar noturno, pois já estava escuro).

Depois de já termos percorrido várias ruas do meu bairro (meu porque já demarquei todos os pontos que você possa imaginar que por ali existam), estávamos chegando perto de um local chamado Praça das Pedras. No caminho tinha um enorme monte de sacos de lixo, pois quinta-feira é um dos dias da semana em que a Prefeitura recolhe o lixo, percebi algo se movendo no meio daquele monte fedorento, parei e tentei cheirar, quando o meu dono também curioso me perguntou o que eu estava vendo. Foi quando do meio daquela montanha de lixo saiu a coisa mais orelhuda que já tinha visto.

Pequenina, muito curiosa, pretinha e marrom, com uma meia lua na parte superior do pescoço, compridinha e com as patinhas curtas e brancas nas pontas. Era uma clara mistura de Beagle com Basset. Já estava começando a garoar de novo e meu pai, morrendo de dó, a pegou no colo e começou a subir a avenida em direção ao consultório da Tia Nícea perguntando pelo caminho se alguém sabia de onde a cachorrinha era. Na porta de um condomínio disseram que ela estava por ali desde aquela manhã, de baixo de chuva e com fome. Eu ia acompanhando o meu pai não entendendo nada e pensando: o que ele ia fazer com aquela coisinha?

Chegando na tia, ela examinou-a com cuidado, dizendo que tinha pouco menos de 1 ano e que estava saudável, exceto pela coleção de carrapatos e pulgas que estavam “hospedados” na coitada. Aplicou uma injeção para eliminar aqueles bichos nojentos e dizendo que ajudaria meu pai a encontrar um lar párea a bichinha, aconselhou-o a traze-la para casa por pelo menos aquele final de semana. Eu só olhava e apesar dos carinhos da Tia Nícea fiquei meio preocupado com a situação.

Também preocupado, meu pai resolveu traze-la para cá, pois estava muito frio e ainda chovia e não dava nem para deixar a cachorrinha na clínica, pois o hotelzinho já estava cheio por conta do feriadão e nem devolve-la para as ruas.

Ao chegarmos em casa com ela no colo ele perguntou: “o que eu faço com isso?” Todo mundo se apaixonou pela nova hóspede e começou a “batalha” para escolher um nome para ela. Palpite daqui, palpite dali e a namorada na época do Fábio, a Luciana que vieram passar a semana santa em Guarulhos, acabou escolhendo Preta. Assim ela foi batizada. Tinha medo de entrar em casa e não passava da porta da cozinha, se bem que com aquele monte de “hóspedes” que ela trazia, era melhor ela ficar lá fora mesmo. Então naquela noite ela dormiu no meu quartinho e eu fui para o quarto dês meus pais. O engraçado, é que apesar da grande quantidade de carrapatos e pulgas que ela tinha, nenhum ficou na minha casa ou me atacou. No dia seguinte todos tinham sumido.

A sexta-feira santa foi de conhecimento da Preta. Filhotona já se sentia à vontade e entrava e saia de dentro de casa. O Fábio e a Luciana adoraram ela, tanto que no final do dia resolveram adota-la e leva-la para Marília de ônibus mesmo.

No dia seguinte, sábado de aleluia, meu pai levou a Preta na Tia Nícea para ser vacinada e tomar todas as providências que a empresa de ônibus exigiu para transportar um animal. Carteirinha de Vacinação, atestado de saúde e um remedinho para ela “apagar” durante a longa viagem, de 6 horas. Meu pai comprou um transporte para a Preta viajar sem incomodar ninguém. Eu dei graças a Deus, pois já estava ficando preocupado com aquela paparicação toda com aquela estranha.

Então no domingo de Páscoa, depois de perder o ônibus da tarde, lá foi a Preta com o meu irmão Fábio e a Luciana para Marília. Pelo que soube a viajem foi longa e cansativa, a Preta dormiu a maior parte do tempo no colo, fora do transporte, mas chegaram todos bem.


Aí começou a parte da história que não presenciei, mas fiquei sabendo pelo que meus pais comentavam. A cadelinha deu uma baita mão de obra pro Fábio.


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Como ele estudava Medicina, precisava ficar o dia todo fora do apartamento e apesar de comprar brinquedinhos para ela, deixar água e ração, ela começou a aprontar dentro do apartamento. Roeu móveis, colchão e cortinas e o pior, descobriu-se que ela tinha o péssimo hábito de comer as próprias fezes (eeeeeecaaaaaaaaa). Praticamente todo dia ao chegar da Faculdade meu irmão precisava lavar quase todo o apartamento por causa da sujeira que ela fazia  Tentaram todos os modos e alternativas para resolver o problema, mas ficou impossível para eles manter a cachorrinha na apartamento.

Apesar de tudo eles gostavam muito dela. Sempre levavam passear, compravam guloseimas e brinquedinhos e a visita ao Pet para tomar banho então era quase que obrigatório, por causa da sujeira que ela aprontava.

Então, depois de mais ou menos 2 meses, lá fomos nós, em excursão buscar a Preta em Marília para traze-la de volta para Guarulhos e tentar “concertar” ela. Afinal o Fábio apesar de tentar, estava ficando sem tempo de cuidar da Prata e era judiação deixar uma mestiça de Basset com Beagle (duas raças bem agitadinhas) presa o dia todo em um apartamento. Ela ia aprontar o resto da vida.
 
Aqui a coisa também ficou complicada. A minha mãe sozinha (pois meu pai trabalha) não conseguia dar conta de cuidar da casa, de mim e de uma cachorrinha agitada e que ainda por cima tinha aquele hábito alimentar que, por mais que tentassem, não conseguiam eliminar.

Apesar de tudo nós nos dávamos bem. Eu a achava meio folgada, pois não demorou nadinha para subir no sofá, na camona e tomar conta da casa. Aquele medo de ser deixado de lado começou então a aumentar e eu não queria saber de nada. Ficava muito tempo quieto e triste no meu canto, o que preocupava bastante meus pais. Naquele período eu tive duas ou três convulsões.

Certa ocasião, minha mãe precisou ir ao dentista e como via que nós não brigávamos e que a Preta se comportava dentro de casa, forrou um dos sofás e nos deixou dormindo lá. Acontece que assim que minha mãe saiu, aquela sem vergonha da Preta, subiu até o quarto do Renato e cavou um buraco tão grande no colchão dele que cabia ela dentro. Fez o serviço, desceu e veio deitar ao meu lado, esperando minha mãe voltar na maior “cara de pau”. Minha mãe entrou em casa e achando linda aquela cena, subiu para se trocar. Foi quando ela viu o estrago e quase caiu dura. Ligou para o meu pai que na época trabalhava perto de casa. Ele veio e ao ver o que a Preta tinha feito deu a maior bronca nela que assustada ainda por cima fez xixi no mesmo colchão.

Outra história que foi até engraçada, tamanha a cara de “uééé” que meus pais fizeram, foi quando um senhor esteve lá em casa para fazer um orçamento para cobrir a garagem. Era hora de almoço e para que eles pudessem conversar direito, meus pais deixaram a Preta e eu na cozinha. Acontece que sobre a mesa estava o prato de comida da minha mãe quase intocado, com arroz, feijão e alguns pedaços de frango. Vocês acreditam que a Preta, com aquele tamanho subiu na cadeira, na mesa e “almoçou” todo o prato da minha mãe? Eu vi e custo à acreditar até hoje. Pois é, quando ela voltou para a cozinha não acreditou no que viu, ou no que não viu, a comida dela. Não deu nem para brigar com aquela cachorrinha sem vergonha.

Foi então que começou a campanha para a doação da Preta, já que chegou-se à conclusão de que seria impossível para ela ficar em casa. Minha mãe cansada, eu cada vez mais deprimido (não queria descer da cama e sair do quarto de jeito nenhum) e o meu pai super estressado, o que era preocupante já que ele já tinha enfartado.

Certa vez, na sala de espera da Pet Family, meu pai comentou que a situação em casa já estava quase insustentável e que se não encontrasse logo um dono pra Preta, ela ia voltar para a rua. Ele já estava desesperado e muito preocupado comigo e se tivesse que escolher todos imaginam qual seria a atitude dele. Ele sempre diz, “a família em primeiro lugar, sejam membros de duas ou quatro patas”. Foi aí que um bando de protetoras malucas, ficou ligando aqui em casa dizendo desaforos, sendo que uma foi muito mal educada com a minha mãe que ficou chocada. Eu sei o nome dela, mas é melhor não dar essa moral. Não sabemos até hoje quem deu o número do telefone para elas, mas foram bastante desagradáveis e intrometidas. A única que deu a maior força e ajudou bastante o meu pai foi a Mara. Ela não faz parte das malucas.

Devo lembra-los que naquela época meu pai ainda não tinha o conhecimento sobre espiritualidade dos animais que tem agora. Hoje ele não pensaria daquela forma, tenho certeza, pois esse conhecimento o despertou para várias coisas boas relacionadas a nós, juntamente com minha adorada mãe.

Poucos dias depois, chegou a época que todos mais temiam e que eu adorei. A Preta entrou no cio. Aquele aroma era impossível de se resistir e eu passei só a pensar naquilo. Foi uma noite de sábado terrível. Para mim que fiquei doidão e para os meus pais que não sabiam o que fazer. Até que a certa altura da madrugada., depois da Preta uivar e chorar sozinha e não deixar ninguém dormir, meu pai pegou nós 2 pelo cangote, deu a maior bronca e nos colocou para dormir no quarto dele. Dormimos o resto da noite sossegados, cada um no seu canto. Foi a primeira vez que a Preta dormiu no nosso quarto.

Nessa época foi que minha mãe descobriu os seus dotes de fabricante de calcinha para cachorro. Tinha até o buraquinho para o rabo cumprido e fino da Preta. Meu pai, quando percebeu a situação da cachorra, foi ao Pet e comprou umas duas calcinhas para cachorra e a minha mãe fez mais algumas. O grande problema era que a pornográfica da Preta tirava a calcinha na garagem, deixava elas lá e ainda por cima destruía os absorventes (ecaaaaaa, de novo). Isso realmente não era uma atitude decente de uma cadela de respeito. Por conseqüência, os absorvente depois de algum tempo, passaram a fazer parte da lista de comprar de mercado dos meus pais.

A campanha de doação continuava e no dia seguinte apareceu uma pessoa que se interessou em adotar a cachorrinha, tudo certo e lá foi ela num domingo à noite. Dois dias depois, após receber uma denúncia, meus pais e eu fomos até o Parque Novo Mundo em São Paulo busca-la de volta, pois a Preta tinha sido deixada nas ruas de novo. Chegando lá, nós a encontramos rodeada por 3 cachorros, meu pai botou eles para correr e apanhou a Preta, que por sinal continuava com aquele odor irresistível de cachorra no cio.

Só que desta vez ela não veio para casa. Ficou num hotelzinho da Drª Marjorie que aceitou ficar com ela até a cirurgia de Castração que foi feita pela Tia Nícea. Lá ela também chorou e uivou por duas noites seguidas, (até o Diretor do Hospital Stela Maris que ficava nos fundos do hotelzinho ligou para reclamar).

Após a castração ela voltou para a nossa casa, novamente aguardando alguém que a dotasse em definitivo. Cartazes, anúncios em jornais e boca-a-boca, até que num belo domingo de sol, apareceu em casa um casal com uma linda menina que se apaixonou na hora pela Preta, o que me pareceu ter sido recíproco, pois a cachorrinha adorou a menina. A Preta entrou no carro, ficou em pé no banco de trás e nem deu tchau.

E essa foi a última vez que vimos aquela cachorrinha. Até hoje meus pais não tiveram mais notícias dela, mas esperamos e torcemos para que esteja bem, afinal ela fez parte das nossas vidas e nos ajudou a crescer bastante.

Sei que meu pai se sentiu frustrado por um bom tempo, pois tinha a esperança de que a estadia da Preta em nossa casa desse certo, pois tanto ele como minha mãe achavam que seria bom uma companhia para mim. Mas o tempo provou que isso jamais daria certo.

Não querendo parecer egoísta, mas eu fiquei aliviado, a depressão passou, pois os meus pais voltaram a ser somente meus, não dividindo a atenção com mais ninguém, pelo menos até aparecer o Duque. Mas isso também é uma outra história.

Abraços

Zeus

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